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Conto, com a Reitora

A paz atende pelo nome ‘igualdade social’

Populorum Progressio (Progresso dos Povos), uma das mais importantes encíclicas da Doutrina Social da Igreja Católica, completa 50 anos. Foi sobre ela que fiz a palestra de encerramento do Colóquio “Por uma Cultura da Paz”, nos dias 8, 9 e 10 de maio, na PUC-Campinas, evento que contou com a participação de professores catedráticos e personalidades do Clero.

É também sobre esse importante documento que pretendo falar a vocês, alunos, coordenadores, professores e funcionários, mas não tanto pelo seu cinquentenário, mas pela oportunidade de resgatar o clamor do Beato Paulo VI, seu autor, por um mundo mais justo e solidário nesse momento tão conturbado da sociedade brasileira. Esse clamor encontra eco em diferentes partes do mundo, mas excepcionalmente em nosso País, que se vê às voltas com reformas que, ao que tudo indica, seguem caminhos contrários ao que ali está escrito.

A Encíclica foi anunciada em um momento particularmente tenso para o mundo, ainda sob o impacto da guerra fria e das desigualdades sociais, e trazia uma pauta sugerida pelos bispos da América Latina que não pôde ser desenvolvida a contento pelo Concílio Vaticano II, finalizado dois anos antes: como combater o enorme fosso social entre países ricos e os do terceiro mundo. O Beato Paulo VI pedia que houvesse, sobretudo por parte das pessoas da Igreja, um engajamento em projetos de missão no sentido de se transferir conhecimento aos países do terceiro mundo.

O cenário econômico mundial naquele momento não era muito diferente do que vivenciamos hoje: os povos de terceiro mundo ofereciam a matéria prima para os mais ricos e, posteriormente, importavam os bens industrializados/beneficiados a preços proibitivos. O fato de não poderem contar com a colaboração de países ricos para o desenvolvimento de tecnologias de ponta aumentava sua dependência econômica desses mercados e a consequente submissão à lógica capitalista. Nesse sentido, o documento que, em síntese, defende que a paz só será possível a partir do desenvolvimento dos povos, se mantém atualizado e necessário. 
Não podemos negar os avanços da economia e dos meios de produção da década de 60 aos dias de hoje. Mas cinquenta anos depois a desigualdade social não só persiste no mundo como tem aumentado, tornando as questões de centro da Populorum Progressio  imperiosamente urgentes e de impressionante atualidade. Houve, sem dúvida, progresso e transferência de conhecimento em alguns setores – mas ainda é gritante a defasagem em relação ao conhecimento e à qualidade da educação que se tem nos países mais pobres versus ao que está em voga nas nações ricas.

Atualmente, a educação tem aumentado em extensão, mas peca pela qualidade, pois se transformou em mais um produto a serviço dos conglomerados empresariais. O que houve em todos os campos possíveis foi a progressão hegemônica da mentalidade comercial desses países ricos, sobretudo sob a égide dos projetos ordoliberal, na Alemanha, e neoliberal nos Estados Unidos, em grande parte do Terceiro Mundo.

A prerrogativa desses projetos é desconstruir o Estado de bem-estar social e fazer do Estado de direito um parceiro. O que a mentalidade neoliberal almeja é tirar o Estado da linha de frente das questões que interessam diretamente à população (como saúde, educação, infra-estrutura, etc.), e transformá-lo numa grande máquina jurídica para que possa fazer as leis e manter sua estrutura a serviço da mentalidade empresarial. Esse é o embate com a Encíclica Populorum Progressio.
Em síntese, é exatamente isso que está por trás das reformas em curso em Brasília. Diminuir a máquina estatal e, consequentemente, sua responsabilidade pelo bem-estar dos cidadãos, via redução dos direitos e conquistas nos campos, por exemplo, da seguridade hospitalar e previdenciária. Para manter esse estado de bem-estar social que a população precisa, o Estado precisaria manter os tributos, e isso não convém à lógica do lucro.

A Encíclica Populorum Progressio, do Beato Paulo VI, defende o desenvolvimento econômico e social pela consciência de solidariedade; diz que a melhor maneira de diminuir os conflitos entre os povos é reduzindo a desigualdade social – e isso só será possível com a transferência de riqueza das nações ditas desenvolvidas também para as pobres – e aqui não estou me referindo apenas à monetária.

Estamos diante de algo ainda sem solução. Como resposta à pressão neoliberal, a Igreja, cinco décadas depois, chama a atenção para a riqueza humana desse documento. Temos de pensar conjuntamente e de forma crítica e isenta, pois a defesa do Estado de direito em função do bem-estar social é premente. Esse momento de reformas no País é “kairótico”, e não caótico. Ele se apresenta oportuno para o ideal liberal se instalar definitivamente nas instâncias do Poder por meio das reformas instauradas a toque de caixa. A razão dominante e a noção equivocada de capital humano agora se colocam de forma imperativa. A defesa é que cada um seja responsável pelo seu investimento – chega de o Estado investir – e ‘culpado’ por suas más escolhas. Este é um assunto do qual pretendo voltar a falar com vocês muito em breve.

Reitor Prof. Dr. Pe Edelcio Ottaviani

São Paulo, 14/05/2017

Imagem de uma mulher branca, loira de cabelos lisos, sorrindo com um fundo escuro.

Profª. Drª. Karen Ambra

Reitora do Centro Universitário Assunção - UNIFAI